Páginas

sexta-feira

 

De todas as formas ela estava sozinha

De todas as formas ela queria estar sozinha

Sua força era areia levada pelo vento, banhada pelos mares na ampulheta do mundo

De todas as formas, ela sempre esteve sozinha

De todas as formas ela nunca esteve sozinha

Ao seu lado andavam mães e mulheres em cujo ventre nunca floresceu raiz

Mulheres cujo ventre foi violado por bichos

Ao seu lado estavam homens cujo corpo fora violado por ferros

Ao seu lado estavam crianças que não tiveram a chance de voltar para a escola

Ao seu lado estavam crianças que não tiveram a chance de ser crianças

                                                  cujo corpo fora violado tantas vezes que só lhes restava desespero

Ao seu lado estavam guerreiros cujo sangue evaporara em nuvens densas

De todas as formas, por todas as eras desde tempos sem início, ela tinha a seu lado uma fonte de beber  árvores que dançaram com ela em todo momento de desespero e alegria

Ela não tinha medo de morrer sozinha conhecia desde tempos sem início este encontro

conhecia desde tempo sem início um vale onde lavar os pés encharcados de memória  

Um corpo pouco são mas seu

Um corpo denso demais para ser replicado

Um corpo etéreo demais para ser falso

Desde tempos sem início ela estava sozinha juntando fios até formar cabelos, juntando fios até formar cabeça, juntando fios até tecer pescoço e serpentear  os nomes das coisas.

Uma tessitura infinda de dioramas-pele rabiscando mandrágoras inteiras na garganta das galáxias

Ao seu lado caminhava uma nação sozinha

Sozinha, uma nação de pé para assistir atenta cada movimento estrondoso e litúrgico de um pequeno germe

Uma nação sozinha imensa

Uma ode se ouvia baixinho, mandando fazer, mandando tirar

Gritos acordaram os pensamentos de uma estrela guia e ela parou congelada e olhou ao redor

O que viu, contou somente a um ente seco que chorou tanto a ponto de minar água de novo para que outros povos pudessem se banhar.

Nenhum comentário: