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domingo

Coreografia para ele

Dancei e te mandei embora.
Daquele filme inteiro eu só guardei a frase da moça: "O pai é o primeiro homem na vida de uma garota".
A vida inteira eu fiquei esperando você voltar. Nunca me ocorreu te mandar embora. Depois parece que ficou mais fácil respirar. Deixar você ir. Deixar-me aqui, olhando você ir. Sem mágoa.
Ficaram perguntas que não servem para nada.
O que eu posso fazer de bonito com isso agora? Me ocorreu que seria legal pensar em você toda vez que eu dançar. Dançar pra você mais vezes. Dançar celebrando que eu te deixei ir e que você foi.
Dançar em cima desse meu "complexo de rejeição". Dançar em cima daquilo que realmente eu tenho de feio. Sapatear bem até isso virar barro e fundação de uma casa bem bonita.
Você foi e eu deixei. Você queria ir e eu compreendi. Já era tempo. Já era outra estação.
O segundo e o terceiro homem na vida de uma garota. Eu já não sou uma garota. Faz tempo. Já é outra estação, eu sei.
Cada passo meu te chamou até ali, só pra você ir embora. E você foi.
O vazio é bom porque pode ser qualquer coisa, pai.
Havia algo de sensual quando eu dancei pra você. Mas era só pra você ficar desgostoso- como homem- de estar se apartando de mim.
Não sou uma boa menina. Sou uma mulher que dança para mandar seu pai embora.
Sou uma mulher que carrega parentes por dentro.
Meus ancestrais cantavam e dançavam e isso era sério e sagrado. Isso fazia a vida presente suportável e agradável.
Com essa memória ancestral no corpo eu danço. E toda vez é bom.

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